Desespero

Ficha técnica
Título Original: Desperation
Título Traduzido: Desespero (1997 – Presente)
Ano de Publicação: 1996
Páginas: 568 (Edição de 2012 – Editora Suma)
Data de Publicação nos EUA: 24/09/1996
Personagens: John Marinville, Cynthia Smith, Collie Entragian, David Carver, Mary Jackson
Conexões: A Torre Negra; Rose Madder; Angústia; A Dança da Morte
Personagens Citados: Norman Daniels
Adaptação: Desespero (2006)
Disponível no Brasil pelas Editoras: Objetiva (1997; 2001; 2005), Planeta DeAgostini (2004), Editora Suma (2012), Ponto de Leitura (2011; 2012; 2014)
Sobre o livro
Um estranho policial começa a parar viajantes na Rodovia 50, em Nevada, e os sequestra, levando-os à cidade de Desespero. Lá, as vítimas em comum devem se unir para desvendar os segredos sobrenaturais que cercam o policial e a cidade, antes que seja tarde demais, pois uma força poderosa e maléfica ameaça se expandir descontroladamente.
Resenha
Desespero é uma obra que mergulha profundamente no terror cósmico e no confronto entre forças espirituais, enquanto reflete sobre a fragilidade humana diante do mal absoluto. Publicado em 1996, o romance de Stephen King funciona como um espelho sombrio de Os Justiceiros (The Regulators), lançado no mesmo ano sob o pseudônimo Richard Bachman. No entanto, Desespero destaca-se por sua amplitude metafísica e pela exploração de temas universais como fé, sacrifício e resistência.
A narrativa começa quando viajantes desavisados, passando pela isolada cidade de Desperation, Nevada, são capturados por Collie Entragian, um policial que parece a princípio apenas corrupto e psicótico. Rapidamente, o leitor descobre que Entragian é apenas uma marionete de Tak, uma entidade maligna de origem antiga e incompreensível. Tak utiliza corpos humanos como hospedeiros, degradando-os física e moralmente, enquanto espalha destruição por onde passa.
O cenário desértico de Desperation é crucial para o impacto da história, funcionando como uma metáfora para o vazio e o isolamento. O deserto, com sua vastidão desoladora e ameaçadora, reflete a vulnerabilidade dos personagens e serve como palco para a luta existencial entre o bem e o mal. É um espaço onde as regras normais da sociedade e da realidade parecem se dissolver, amplificando o terror e o desconforto.
Tak, como vilão central, é a personificação do caos primordial, representando um tipo de mal que transcende a compreensão humana. Sua origem, conectada às minas de Desperation, remete a um terror arquetípico que emerge das profundezas da terra – um lugar que simboliza tanto os segredos enterrados da história quanto os recessos mais obscuros da mente humana. A presença de Tak é opressiva, uma força que não apenas destrói, mas corrompe, refletindo a capacidade do mal de distorcer tudo o que toca.
O contraponto a Tak é encontrado em David Carver, um menino cuja fé inabalável se torna uma força central na narrativa. David, após a perda de seu irmão, experimenta uma conexão espiritual que o coloca em contato direto com um Deus que não é o de conforto tradicional, mas sim um Deus de exigências e mistérios. Essa representação divina é um dos aspectos mais provocativos do livro; o Deus de Desespero não é simples ou benevolente, mas complexo, demandando sacrifício e coragem em troca de proteção e direção. King desafia a visão convencional de divindade, apresentando um Deus que reflete a ambiguidade e a dureza do mundo real.
Os personagens presos em Desperation são cuidadosamente construídos para explorar diferentes facetas da condição humana. Desde Ralph Carver, que luta para conciliar seu papel de pai com a impotência diante do perigo, até Cynthia Smith, uma artista boêmia cuja ousadia mascara suas próprias inseguranças, cada personagem traz uma perspectiva única sobre resistência, medo e redenção. A dinâmica entre eles cria uma teia de conflitos que vai além do enfrentamento com Tak, abrangendo suas próprias batalhas internas e a necessidade de encontrar propósito mesmo nas circunstâncias mais adversas.
A cidade de Desperation também funciona como uma alegoria para a deterioração da moralidade em face do desespero. Seus edifícios abandonados e ruas vazias são um lembrete da impermanência da civilização e da facilidade com que a ordem pode se desintegrar. King utiliza esse ambiente para explorar temas como a arbitrariedade da violência e a persistência do espírito humano diante do aniquilamento iminente.
A morte desempenha um papel central na narrativa, tanto literal quanto simbolicamente. A cada sacrifício, os personagens são forçados a confrontar não apenas a possibilidade de sua própria extinção, mas também o significado de suas vidas e ações. A morte, em Desespero, é tanto um fim quanto uma transição, uma porta que leva a algo maior e mais incompreensível. Essa abordagem dá à história uma qualidade quase litúrgica, transformando cada perda em um ato de significado profundo.
A estrutura do romance reflete o próprio caos que Tak encarna, com saltos narrativos que aumentam a tensão e criam um senso de imprevisibilidade. King utiliza essas mudanças de perspectiva para ampliar o impacto emocional, permitindo que o leitor se conecte intimamente com os personagens enquanto eles enfrentam seus momentos mais sombrios.
Embora Desespero seja frequentemente lido como um thriller de horror, suas camadas mais profundas revelam um estudo intenso sobre a natureza da fé, a dualidade do bem e do mal e a resiliência do espírito humano. Ao confrontar Tak, os personagens não apenas lutam contra um inimigo externo, mas também enfrentam seus próprios medos e dúvidas mais íntimos. É nesse confronto interno que reside a verdadeira essência do romance: a capacidade de encontrar luz em meio às trevas, mesmo que apenas uma faísca.
O final de Desespero é tanto uma resolução quanto uma provocação, deixando o leitor com mais perguntas do que respostas. King não oferece um fechamento completo, mas sim uma oportunidade de refletir sobre os temas apresentados – uma escolha que reforça a profundidade e a ambiguidade do romance. Em última análise, Desespero é uma meditação poderosa sobre a fragilidade e a força humanas, um lembrete de que mesmo no vazio mais avassalador, ainda há espaço para resistência e significado.
Curiosidades
- “Irmão gêmeo” do livro Os Justiceiros, escrito pelo pseudônimo de King. Ambos os livros têm os mesmos personagens, porém não acontecem no mesmo universo. King diz que quis fazer a experiência de pegar os personagens de um romance e pô-los em outro, como se fossem uma companhia de teatro em peças distintas.
- O livro aparece brevemente, caído no chão, no filme O Espetacular Homem-Aranha, quando o Homem-Aranha é jogado pelo Lagarto numa estante de livros, em uma biblioteca escolar.
- A inspiração veio quando King visitou a comunidade de Ruth, Nevada, em 1991, passando pela Rodovia 50. Vendo tudo deserto, ele primeiro imaginou que a cidade estava toda morta, depois se perguntou quem teria causado isso, e então decidiu que tinha sido o xerife da cidade. Três anos depois, viajando por lá novamente em sua motocicleta, Stephen ouviu falar da história de mineradores chineses que haviam sido deixados dentro de uma mina próxima a Ruth, quando ela colapsou, porque seus empregadores não queriam arriscar suas vidas para salvá-los.
- A maioria das capas dos livros, brasileiras ou internacionais são desenhadas de modo que continuem o desenho do livro Os Justiceiros.
Referências de Personagens
- No início do romance, quando Entragian parou Peter e Mary, uma pequena bolsa com maconha foi encontrada. Naquele momento, Mary se lembra de sua cunhada que se casou com um cara chamado Roger Finney. Significa algo para você? Sim, é, na minha opinião, outro nome para Randall Flagg. E além disso, a bolsa tem um pequeno adesivo de Smiley, assim como Flagg tem em sua jaqueta.
- A irmã de Peter coloca um adesivo de carinha sorridente em tudo. Outro possível referência a Randall Flagg.
Referências Narrativas
- Cynthia Smith aparece em Rose Madder.
- O termo “can-toi” usado por Collie também é usado na série A Torre Negra. As Irmãzinhas de Elúria falam a mesma linguagem que Tak. Tudo o que Roland entende, em sua história, é “can de lach, mi him en tow”.
- Steve menciona que viveu com sua família em Arnette, cidade do protagonista de A Dança da Morte.
- Um dos personagens menciona os Tommyknockers, embora se refira a eles como os verdadeiros seres que são (demônios de minas, ao invés de extra-terrestres, como no livro Os Estranhos).
- Ellen Carver menciona um dos romances de Misery Chastain, escrito por Paul Sheldon.
Assuntos Recorrentes
- Um dos personagens principais é um escritor, Johnny Marinville é um vencedor do National Book Award e quase ganhou o Prêmio Nobel de Literatura. Curiosidade: sua turnê de motocicleta pela América é baseada diretamente na turnê de Stephen King, pela Insomnia, em 1994.