Achados e Perdidos

Ficha técnica
Título Original: Finders Keepers
Título Traduzido: Achados e Perdidos
Ano de Publicação: 2015
Páginas: 352 páginas (Editora Suma)
Data de Publicação nos EUA: 02/07/2015
Personagens: Bill Hodges, Jerome Robinson, Holly Gibney, Peter Huntley, Morris Bellamy, John Rothstein, Peter Saubers
Conexões: O Iluminado, Quatro Estações
Personagens Citados: –
Disponível no Brasil pela editora: Editora Suma (2016)
Sobre o livro
“― Acorde, gênio.” Assim King começa a história de Morris Bellamy. O gênio é John Rothstein, um autor consagrado que há muito tempo abandonou o mundo literário. Bellamy é seu maior fã ― e seu maior crítico. Inconformado com o fim que o autor deu a seu personagem favorito, ele invade a casa de Rothstein e rouba os cadernos com produções inéditas do escritor, antes de matá-lo. Morris esconde os cadernos pouco antes de ser preso por outro crime. Décadas depois, é Peter Saubers, um garoto de treze anos, quem encontra o tesouro enterrado. Quando Morris sai da prisão, depois de trinta e cinco anos, toda a família Saubers fica em perigo. Cabe ao ex-detetive Bill Hodges e a seus ajudantes, Holly e Jerome, protegê-los de um assassino agora ainda mais perigoso e vingativo.
Resenha
Achados e Perdidos (Finders Keepers), uma obra de Stephen King, é uma narrativa que mescla suspense e mistério com uma análise profunda sobre o desejo humano e as consequências das nossas escolhas. O livro, que segue os eventos de Mr. Mercedes e é parte da trilogia Bill Hodges, expande o universo de King para além da simples resolução de crimes, explorando temas mais complexos como obsessão, vingança e o poder das palavras.
O enredo gira em torno de Morris Bellamy, um homem obcecado pelo autor John Rothstein, que escreveu uma série de livros de grande sucesso, mas se retirou da vida pública antes de concluir a história. Quando Morris descobre um tesouro de anotações inéditas do autor, ele entra em uma espiral de loucura e ganância, disposto a tudo para preservar seu achado e evitar que outros descubram a mesma coisa. A história também segue o jovem Pete Saubers, que, ao encontrar os cadernos, se vê em um dilema moral e existencial sobre o que fazer com a descoberta e como isso afetará sua vida e a de sua família.
A metáfora central em Achados e Perdidos é a ideia de posse — o conceito de “encontrar e manter” algo que pertence a alguém, mas que, por alguma razão, se torna parte da busca individual de outra pessoa. Morris é o epítome dessa obsessão, um personagem que personifica a ideia de que, uma vez que algo é encontrado, ele se torna seu proprietário legítimo, mesmo que essa posse envolva destruição e violência. A metáfora do “encontrar” serve também como um reflexo da própria busca por significado na vida, uma tentativa de tomar algo de outro para preencher o vazio interior. King utiliza isso para questionar o que realmente significa “posse”, seja no campo material ou emocional, e o custo dessa necessidade.
A analogia entre a obsessão de Morris e a prática de colecionar é palpável em várias passagens do livro. Morris vê os cadernos como algo mais que simples anotações; eles são, para ele, a chave para a realização de um desejo não só de completar a obra do autor, mas de controlar a própria narrativa da história. Este desejo de possuir algo intangível, como o “fim da história”, pode ser entendido como uma analogia para o controle que os indivíduos tentam exercer sobre aspectos de suas próprias vidas e destinos. A analogia é clara: a obsessão por algo — seja material ou imaterial — consome as pessoas, as transforma em seus piores pesadelos.
O autor também explora a ideia da violência como uma reação à perda. Morris, ao perder seu acesso ao tesouro de anotações, recorre à violência, o que leva a um conflito em que as consequências dos seus atos se tornam cada vez mais destrutivas. A violência não é apenas física, mas também psicológica, afetando todos os envolvidos, desde a vítima até os personagens secundários, como o próprio Pete. A ideia de “perder” e “ganhar” é explorada em diversas camadas, trazendo à tona o tema da vingança e do desgaste emocional causado pelo desejo de reverter o que não pode ser recuperado.
Há também um simbolismo significativo nas figuras de John Rothstein e dos seus cadernos. Rothstein, o autor recluso, representa a arte que transcende a busca comercial, algo que deve ser protegido de maneira pura. No entanto, ao ser lido e reescrito, o autor se torna parte de um ciclo maior de desejo, e suas obras se tornam objetos de desejo, um reflexo de como a arte pode ser apropriada e distorcida para atender à ganância pessoal. Rothstein, em sua retirada, também simboliza o isolamento do criador, que, ao fugir das expectativas do mundo exterior, acaba sendo “possuído” por aqueles que buscam aproveitar sua arte de maneira egoísta.
Outro elemento crucial é a relação entre Pete e sua família, que estão à margem da pobreza. O contexto social e familiar deles é uma maneira de King lembrar o leitor da ideia de “o que realmente importa”, contrastando as vidas cotidianas com os horrores das ações de Morris. A inocência de Pete, sua tentativa de agir com moralidade em meio à situação, serve como um contraste importante à corrupção representada pela obsessão de Morris. King usa isso para mostrar que, enquanto alguns buscam riquezas materiais ou status, outros buscam preservação moral, algo que muitas vezes é tão valioso quanto qualquer tesouro material.
Achados e Perdidos também pode ser visto como um comentário sobre o papel da literatura e da criação artística. A busca por completar a obra de outro ser humano, que se torna uma obsessão, reflete a luta eterna entre a criação e a destruição. Quando Morris tenta reescrever a história de Rothstein, ele tenta não só controlar o destino do autor, mas também manipular a verdade, distorcendo uma criação para atender a um desejo pessoal. A literatura aqui é vista não apenas como algo a ser apreciado, mas como um campo de batalha, onde a autenticidade e a ganância entram em conflito.
O livro, ao lado de outros em sua trilogia, faz uma reflexão sobre a capacidade humana de agir por impulso, em busca de algo maior do que si mesmo, mas frequentemente se deixando consumir por esse desejo. King traz uma história de tensão e horror psicológico, misturando com maestria questões filosóficas e sociais com o terror puro e simples que caracteriza sua escrita. A narrativa, enquanto simples em sua premissa de um crime e sua solução, se aprofunda nas motivações humanas e nas consequências das nossas ações, oferecendo uma visão complexa da natureza humana e das forças que nos movem.
Referências Narrativas
- O código de segurança de Andy Halliday é 9118 – soma da 19, número importante na mitologia da A Torre Negra.
- Brady Hartsfield encontra-se no quarto 217 depois que ele acordou do coma, mesmo númere doperigoso quarto do Hotel Overlook em O Iluminado.
- Para Holly Gibney, a trilha sonora de The Shawshank Redemption é uma das melhores trilhas sonoras de todos os tempos.
- Pete Saubers interpreta Morris Bellamy tão mal, quanto uma vez Paul Sheldon errou com uma certa Annie Wilkes no romance
- Morris Bellamy cria uma reputação e proteção na prisão, tornando-se um “escriba” para seus companheiros de prisão. Ao escrever cartas ou pedidos de reclusos, por exemplo, ele é protegido contra o estupro em troca. É a mesma tática que Andy Dufresne de no conto Rita Hayworth e a Redenção de Shawshank do livro Quatro Estações, usou quando ele foi preso na prisão de Shawshank.
- O bibliotecário Alvin Brooks, com quase 60 anos, lembra Brooks Hatlen, de 60 anos de idade, que administrava a biblioteca na prisão de Shawshank no conto Rita Hayworth e a Redenção de Shawshank do livro Quatro Estações.