Título Original: Revival
Título Traduzido: Revival
Ano de Publicação: 2014
Ano de Publicação no Brasil: 2015
Cidade da História: Harlon
Personagens Principais: Carles Jacobs, Jamie Morton, Astrid, Mary Fay
Adaptação: —
Páginas: 376
Tradução: Michel Teixeira
Disponível no Brasil pelas Editoras: Suma de Letras (2015)
Sinopse
Em uma cidadezinha na Nova Inglaterra, mais de meio século atrás, uma sombra recai sobre um menino que brinca com seus soldadinhos de plástico no quintal. Jamie Morton olha para o alto e vê a figura impressionante do novo pastor. O reverendo Charles Jacobs, junto com a bela esposa e o filho, chegam para reacender a fé local. Homens e meninos, mulheres e garotas, todos ficam encantados pela família perfeita e os sermões contagiantes.
Jamie e o reverendo passam a compartilhar um elo ainda mais forte, baseado em uma obsessão secreta. Até que uma desgraça atinge Jacobs e o faz ser banido da cidade.
Décadas depois, Jamie carrega seus próprios demônios. Integrante de uma banda que vive na estrada, ele leva uma vida nômade no mais puro estilo sexo, drogas e rock and roll, fugindo da própria tragédia familiar. Agora, com trinta e poucos anos, viciado em heroína, perdido, desesperado, Jamie reencontra o antigo pastor. O elo que os unia se transforma em um pacto que assustaria até o diabo, com sérias consequências para os dois, e Jamie percebe que “reviver” pode adquirir vários significados.
Crítica
Revival é aquilo que Steve sabe fazer de melhor; um bom livro de terror. Mas, apesar do livro ter sido alardeado como “a volta de Stephen King às suas origens” (e, em certo nível, ele é, principalmente a segunda metade do romance) ele não é apenas isso. Na verdade, como na maioria dos seus livros, o terror é apenas uma “válvula de escape”, um subterfugio do qual o autor se utiliza para alcançar uma história maior, repleta de dramaticidade, mas sem se deixar levar pelos clichês típicos do gênero. Revival é um drama que, entre outras coisas, aborda (mais uma vez) a questão da dependência das drogas. A influência que elas exerceram em Steve fica clara no modo como o personagem principal lida com este conceito e como ele é abordado no decorrer de boa parte do livro. O vício quase incontrolável, a decadência provocada pelo uso constante, a dificuldade em manter relações sociais saudáveis, em se concentrar, conseguir um trabalho descente… Todas as situações pelas quais o próprio King assumidamente passou estão ali, centradas em um Jamie Morton bem semelhante ao Sr. Torrance que conhecemos em “O Iluminado”, mas com a principal diferença de que, enquanto Torrance deixou-se sucumbir pelo vício (com uma pequena ajuda do Hotel Overlook, é claro), Jamie utilizou-se de suas pedras (por sua vez, com uma pequena ajuda do Pastor Jacobs) para fazer degraus (a metáfora é horrível, eu sei, mas juro que não consegui pensar em nada melhor para ilustrá-la). Com relação à solidez destes degraus é que a história talvez possa mudar de figura.
Além das drogas, ainda há o flerte (hora bolas, há quase um casamento inteiro) com a questão da religiosidade, assunto que Steve já abordou inúmeras vezes e de diversas maneiras diferentes em seus romances. Na figura do pastor Charles Jacobs, temos um homem que, após um horrível acidente de carro, perdeu sua fé, substituindo-a pelo amor à ciência (mais especificamente à eletricidade). Jacobs passa então a se envolver em projetos relacionados ao uso de uma “eletricidade secreta” como forma de curar as pessoas, fazendo uso, muitas vezes, de sua antiga figura de pastor para “forjar” situações e arrecadar dinheiro para ser empregado em, ao que tudo indica, “um plano maior”. É interessante como Steve consegue nos fazer ter empatia até pelos vilões (se é que podemos dar esta definição para o ex-pastor Jacobs). Assim como os mocinhos da história, os vilões de Steve são extremamente “vivos” e não raro padecem de motivações maiores do que as dos próprios “heróis”, e ainda que eu tenha (e aqui é uma opinião bastante pessoal) achado a motivação final de Jacobs um tanto quanto “inocente”, eu não sei se no lugar dele eu agiria de outra forma.
Logo no início do romance você descobre que as vidas de Charles e do ex-pastor Jacobs estão intimamente ligadas, desde a infância de Jacobs, quando ele recebe a visita do então novo pastor local, enquanto brincava com seus soldadinhos de plástico. Neste ponto do romance há aquela mesma sensação nostálgica que permeia boa parte de outra obra de Steve, da qual já falamos anteriormente (Joyland), em especial pela escolha da narração em primeira pessoa. Acompanhamos a vida do jovem Jaime de perto desde pequeno. Seus medos, suas inseguranças, suas aventuras juvenis, e, principalmente, a chegada da maturidade e o modo como ela influência, de maneira direta (para não dizer “desleal”) no desfecho da história. Assim como na vida real, o Jaime adulto acaba se provando bem mais interessante do que o Jaime adolescente, e suas decisões possuem um peso bem maior para a história.
E claro… Temos a eletricidade, que diferente da maioria dos outros livros do autor, não é um mostro, no sentido literal da palavra, e nem surge de repente, para puxá-lo para baixo da cama ou para dentro de um bueiro. Nas palavras do próprio Steve, ela vem devagar e você só percebe que o raio está chegando porque há um sentimento de “falta de ar” no ambiente e isso é literalmente passado nas entrelinhas do romance para o leitor. Steve sempre foi bom com essa coisa do “acúmulo do terror”, da tensão latente que ele parece construir com o enredo se desenvolvendo devagar, mas de maneira progressiva (e por vezes exageradamente calculada) e em “Revival” ele faz isso muito bem.
Com um final de tirar o fôlego do leitor, com uma boa dose de terror escatológico, Revival versa ainda, e principalmente, sobre a questão da maturidade, da responsabilidade de crescer e envelhecer no século 21, da dificuldade em lidar com as perdas inevitáveis, inclusive a da fé (seja em Deus ou em você mesmo) e sobre os caminhos que traçamos em busca de, talvez, um ponto de apoio que nos dê um suporte suficientemente sólido para enfrentarmos a crueldade e indiferença do universo para com nós, meros mortais.
A versão nacional do livro está muito bonita. A Suma de Letras teve o cuidado de manter o título original, para evitar maiores spoilers para os leitores brasileiros, assim como também a capa, que é a mesma da versão norte-americana, inclusive com um efeito metálico bastante semelhante ao da edição em hardcover (capa dura) da Editora Scribner. O livro já está disponível nas maiores livrarias do país por valores que giram entre R$38,90 (Submarino e Amazon) e R$49,90. A tradução ficou a cargo de Michel Teixeira.
Um adendo: Para uma experiência de imersão mais completa na história, antes que você se aventure em “Revival”, eu recomendo fortemente a leitura do conto “Jerusalem´s Lot” do livro “Sombras da Noite” e do conto de Arthur Machen, “O grande deus pã”, indicado pelo próprio Steve no início do livro. Leitores de H.P. Lovecraft e Mary Shelley também se sentirão bastante familiarizados com a leitura.
Curiosidades
- Uma das ex-bandas de Norm Irving, antigo colega de banda de Jaime, é “The Gunslingers”. “The Gunslinger” também é o nome do primeiro livro da série “A Torre Negra” e também é a definição dada aos descendentes de Arthur Eld, do Mundo Antigo, que juraram representar e defender o Branco, a força Elemental que representa integridade, união e saúde.
- A primeira banda que Jaime toca se chama “Chrome Roses” (Rosas Cromadas), outra clara referência ao universo da Torre Negra, onde a “Rosa” é uma figura de vital importância para o desenvolvimento da história.
- A personagem de Astrid Bree ganhou, quando tinha idade suficiente para dirigir, um Plymouth 1960. O mesmo modelo de outro carro bastante conhecido, Christine, (apesar de Christine ser de 1958).
- Castle Rock e Gate Falls são duas cidades bastante conhecidas das obras de Stephen King que são mencionadas no livro.
- A cidade fictícia de Harlon, onde se passa a história de “Revival” faz fronteira com outra cidade fictícia bastante conhecida, Chersters Mill, onde ocorre a história de Under the Dome.
- O bar “O Tigre Manso” de Castle Rock, visto anteriormente em “Trocas Macabras” é mencionado no livro.
- Em um determinado trecho do romance, o reverendo Jacob cita que trabalhou durante muito tempo, com seus truques, em um parque de diversões chamado Joyland.
- Jerusalem´s Lot também é citada no romance, assim como o grimorio fictício “De Vermis Mysteriis”, que além de aparecer no conto do livro “sombras da noite”, também aparece em Revival. O livro fictício foi criado pelo prolifico escritor norte-americano de histórias de horror e ficção cientifica Robert Bloch (autor do livro “Psicose”, que deu origem ao filme homônimo de Hitchcock) e posteriormente integrado aos chamados “Mitos de Cthulhu”, uma série de histórias que ajudaram a enriquecer o universo de H.P. Lovecraft, autor que inspirou King desde a infância. Lovecraft foi uma espécie de “mentor” de Bloch, que foi um dos primeiros a fazer parte do “Circulo de Lovecraft”, um grupo de autores que tinha por premissa expandir o universo criado por Lovecraft, após a sua morte.
- Em um determinado trecho do livro, o personagem Jamie Morton diz que “a vida é como uma roda” e ela sempre volta ao ponto de início. Este é o mesmo conceito usado pelos pistoleiros, só que eles dão o nome de “KA”.
- A personagem Mary Fay é filha de Janice Shelley, professora de Inglês e Literatura Irlandesa. “Mary Shelley” também é o nome da escritora britânica que deu vida ao clássico Frankenstein e uma das autoras para a qual King dedica o livro.
Além de Mary Shelley, o livro é dedicado a outros autores que inspiraram Steve a ser o que é:
Professor de Língua Portuguesa e Literatura, graduado em Letras pela UEG (Universidade Estadual de Goiás), pós-graduado em arte/educação pela UFG, viciado em literatura de terror/suspense, amante incondicional de séries e Hq´s e fã de carteirinha do mestre Stephen King desde 1996.
5 Responses
Boa tarde a todos! Realmente é mais um livro que me deixou confusa…terror não teve, nem mesmo um medinho de nada…assim como Joyland, é uma história sem nenhum suspense…onde será que foi parar o Stephen King dos velhos tempos, onde até para virar a página dos livros eu morria de medo…affe
Eu gostei bastante de Revival, então sou suspeito para falar, mas realmente, de terror ele só alguns trechos isolados e o final. Abraço e obrigado pela visita Cintia!
Ainda estou digerindo a obra e não sei se a amo ou a odeio!
Amo por me envolver do início ao fim, mesmo não contando com o terror clássico de King e odeio por ter me deixado nessa ambiguidade de sentimentos…
Com certeza não é dos melhores, mas tem lugar especial em meu coração!
Li muito desses autores mencionados por King e O Grande Deus Pã, de Arthur Machen é realmente assustador, impressionante, um ótimo e belo livro! Amei
Realmente é uma história e tanto! King geralmente dá boas dicas, embora derrape algumas vezes rsrs