Longos Dias e Belas Noites Leitores Fiéis! Voltamos com a nossa seção “Personagem da Semana”. Hoje vamos falar um pouco mais sobre uma das personagens mais importantes do livro “A Dança da Morte” (“The Stand”, no original), Abagail Freemantle, conhecida como “Mãe Abagail”. Portanto, se você ainda não leu o livro, esteja ciente de que este post CONTÉM SPOILERS. Leia por sua conta e risco!
Os pais de Abagail, John e Rebecca, foram escravos libertados. Antes da Guerra Civil, o mestre de John era conhecido como Sam Freemantle de Lewis, Carolina do Sul; mas como ele e seu dono tinham uma relação de camaradagem, aquilo foi o suficiente para que o homem continuasse trabalhando para ele como assalariado após a instituição da Décima Terceira Emenda, que aboliu a escravidão e a servidão involuntária nos EUA. Como muitos escravos que foram libertados naquele dia, John acabou por assumir o sobrenome do seu antigo mestre.
No oitavo ano do período que ficou conhecido como a “Reconstrução dos EUA”, após o término da Guerra Civil e quando se deu o início do processo de integração dos ex-escravos afro-americanos, John se mudou com a sua família para Hemingford Home, Nebraska, com uma quantia considerável que recebeu de indenização por parte de Sam, que ele acabou usando para comprar algumas terras. Apesar de ser considerado trabalhador, honesto e inovador, John passou por muitas dificuldades relacionadas ao preconceito racial, mas, com o decorrer do tempo, ganhou o respeito de boa parte dos seus vizinhos. Em 1902 em uma votação comunitária, John foi convidado para fazer parte da aliança Cooperativa de Fazendeiros de Nebrakska conhecida como “Granja”. Isso possibilitou que John, junto com a sua família, pudesse prosperar tal qual os outros fazendeiros que faziam parte do “cinturão do milho”, uma região do Meio-Oeste composta basicamente por fazendas e que ainda hoje é responsável por quase 40% da produção mundial do produto.
Abagail era a caçula de John e Rebecca. Ela casou-se três vezes com David Troots, Henry Hardestry e Nate Brooks e em todas as três vezes teve filhos. Ao todo foram seis meninos e uma menina, sendo que todos eles sobreviveram, mesmo que as condições tenham se mostrado por vezes bem adversas. Até o momento da epidemia em “A Dança da Morte”, Abagail já contava aproximados trinta e dois netos, noventa e um bisnetos e três tataranetos. Todos morreram na praga.
Quando a praga chegou, Abagail tinha 108 anos e permanecia saudável e sábia e continuou assim, já que não tardou a descobrir que era uma das 0,6% de pessoas imunes ao vírus que fora apelidado de “Capitão Viajante”. Com um gênio sereno e equilibrado, Abagail já experimentara muito mais do que a vida poderia proporcionar. Com tendências psíquicas e proféticas, ela cresceu com formação religiosa e às vezes, por mais que se mostrasse uma mulher de fibra, ela parecia simplesmente aceitar seu destino como a vontade de Deus. Outras vezes ela se ressentia por ter vivido tempo o suficiente para testemunhar o encolhimento da propriedade de sua família e a morte de todos os seus entes queridos e se perguntava por que ela não podia simplesmente morrer em paz em sua própria casa. Como resultado, ela descobriu com seu dom profético que antes de morrer longe da terra que tanto ama, ela iria precisar lutar contras as forças do mal do seu homologo maldito, Randall Flagg.
Quando o mundo se divide entre os que apoiam Flagg e os que vão lutar contra ele, é Mãe Abagail que passa a acolher aqueles que decidiram lutar contra o vilão. Após sonharem com a mulher, eles descobrem que precisam ir até a fazenda dela em Hemingford Home, para darem início ao movimento de resistência que vai lutar contra Flagg e seus capangas. Centenas deles começam a chegar em Boulder, após sonharem com ela, e ela faz questão de cumprimentar cada novo viajante pessoalmente. O Comitê da Zona Livre de Boulder se estabelece com Mãe Abagail como líder. Ela se recusa a interferir nos assuntos corriqueiros, porém insiste em ser consultada em todas as questões que estejam relacionadas com Flagg.
Com o tempo, Abagail para de receber as visões e se vê frustrada por Deus não estar falando com ela. Nas palavras da própria Abagail, ela se sente como se estivesse “rezando para um telefone mudo”. Em meio a uma epifania em que a Zona Livre de Boulder não estaria servindo ao propósito pretendido por Deus, devido, em parte, à arrogância da própria Abagail, ela decide deixar uma nota e desaparece no deserto para jejuar, orar e reparar seu relacionamento com Deus para que ela possa voltar a receber suas instruções claramente.
Ao voltar do seu exílio, terrivelmente debilitada e sofrendo de desidratação e inanição agravadas pela extrema velhice, em sua última noite viva ela convoca os cinco sobreviventes membros do Comitê (Stuart Redman , Larry Underwood , Ralph, Glen Bateman e Fran Goldsmith) para a cabeceira de sua cama. Ela explica então que Deus não os poupou da praga para juntá-los e fazerem reconstruir a sociedade, mas que ele fez isso para que eles pudessem confrontar Flagg. Ela afirma que Deus quer que os quatro homens deixem tudo para trás e sigam imediatamente, com as roupas do corpo, não levando nem comida e nem água e viajando a pé. Ela diz ainda que um deles vai cair pelo caminho, embora ela não saiba qual é; os três restante serão levados até Flagg e ela não poderá garantir a vitória ou sobrevivência deles e que isso depende da vontade de Deus. Ao nascer do sol, conforme a própria Abagail havia previsto, ela morre.
Curiosidades:
- No Início de Mago e Vidro, quarto livro da saga “A Torre Negra”, aprendemos um pouco mais sobre a praga que aparentemente erradicou toda a humanidade. No final do livro Jake Chambers encontra sob o para-brisa de um trailer abandonado uma mensagem escrita à mão que dizia; “A mulher velha dos sonhos está em Nebraska. Seu nome é Abagail.” E a mensagem concluía com; “O Homem Escuro está no Oeste, talvez em Vegas.” Roland conclui essa parte da história dizendo “Eu acredito que ele pertence a uma história diferente.”
- Apesar de alguns Leitores acreditarem que Edgar Freemantle, protagonista de Duma Key, tenha algum tipo de parentesco com Mãe Abagail (algumas teorias apontam para a ideia de que ele seja bisneto dela em um dos muitos universos sustentados pela Torre), não há nenhuma evidência que eles possuam algum grau de parentesco, além do mesmo sobrenome.
- Na minissérie de TV de 1994, Mãe Abagail foi interpretada por Ruby Dee, que na época tinha 72 anos. Ela foi indicada ao Óscar de melhor atriz coadjuvante em 2008 pelo filme American Gangster e faleceu no dia 11 de Junho de 2014 na cidade de New Rochelle em Nova York aos 91 anos.
- Em um trecho do livro, quando lemos sobre o passado de Mãe Abagail, ela se recorda de um momento terrível de sua infância, quando ela é mordida por uma doninha e seu irmão, Richard, sugere ao pai que ela poderia estar com Raiva, afim de simplesmente assustá-la. Mais tarde, em uma reunião dos personagens principais da Zona Segura, quando Glen Bateman está falando sobre o inimigo, ele observa que Flagg tem muitos apelidos e que um deles é Richard Freemantle. Mais tarde o próprio Flagg diz que seu verdadeiro nome é Richard. Levando em consideração esta “coincidência de nomes” e que a ligação entre eles é maior do que se imagina (enquanto Flagg é a representação máxima do mau, Mãe Abagail é seu oposto), seriam os dois irmãos?
Professor de Língua Portuguesa e Literatura, graduado em Letras pela UEG (Universidade Estadual de Goiás), pós-graduado em arte/educação pela UFG, viciado em literatura de terror/suspense, amante incondicional de séries e Hq´s e fã de carteirinha do mestre Stephen King desde 1996.
Uma resposta
Excelente texto, muito elucidativo!